Gradualmente, está pintando um novo clima. É o que se nota pela série de declarações recentes em que a comunidade internacional reafirma sua intenção de deter o aquecimento global. Foi esse o tom do presidente americano Barack Obama ao anunciar o Plano de Energia Limpa - que pretende reduzir em 32% as emissões de carbono de usinas termelétricas até 2030; do comunicado do G-7, no começo de junho, prometendo extinguir o uso de combustíveis fósseis até o final deste século; do acordo de novembro do ano passado em que China e Estados Unidos aceitaram assumir metas de redução de emissões e até mesmo, em outro plano, da encíclica papal sobre meio ambiente. São sinais de que pode estar surgindo um consenso sobre a urgência do combate às mudanças climáticas.
Sem esse consenso, é bom recordar, não se aprovam decisões na ONU - âmbito no qual se dão as negociações para uma nova convenção do clima. Claro que esse mecanismo de decisão pode limitar os resultados ao mínimo denominador comum, frustrando as expectativas. É também verdade que algumas dessas declarações devem ser recebidas com cautela, por não virem acompanhadas de metas e prazos. Apesar disso, elas aumentam a esperança de que será gerada a dinâmica necessária para que, na conferência a ser realizada em dezembro, em Paris, se chegue a um acordo que estabeleça compromissos compatíveis com o objetivo de limitar o aumento da temperatura do Planeta em não mais de 2ºC.
Assim, mesmo que certamente vá continuar enfrentando a resistência dos céticos e dos interesses estabelecidos, a agenda da sustentabilidade avança. “Eppur si muove”, e esse movimento, vale lembrar, não é apenas da comunidade internacional e não se restringe à questão climática - ou mesmo à ambiental.
O sucesso desse movimento depende da ascensão de uma nova consciência que leve a mudanças profundas em nossa forma de agir. A sustentabilidade precisa passar a ser vista como uma tendência inexorável e como um imperativo incontornável.
Primeiro porque há outras entidades envolvidas nas discussões sobre o aquecimento global, com iniciativas que vão além do plano interestatal, como a recém lançada Coalizão Brasil Clima, Florestas e Agricultura; o GHG Protocol; a International Chamber of Commerce e o Pacto Global da ONU - que pressionam os governos e, muitas vezes, apresentam propostas a fim de fazer progredir o debate sobre os cortes de emissões.
Segundo, porque a sustentabilidade extrapola a proteção do meio ambiente, como comprova outro significativo consenso a que se chegou nesta semana, acerca da minuta dos “Objetivos de Desenvolvimento Sustentável” da ONU que será ratificada por 193 países em setembro. Estes consistem em 17 grandes objetivos e 169 metas correlatas que compõem uma ambiciosa agenda global para alcançar, nos próximos quinze anos, um mundo menos desigual, sem fome ou pobreza, no qual todos tenham acesso a educação de qualidade, empregos decentes, saúde e qualidade de vida.
Esse e outros instrumentos internacionais que tratam da responsabilidade socioambiental de forma mais ampla são complementados pela ação dos atores privados da sociedade global, que colaboram para o surgimento de normas, diretrizes, instituições e princípios que começam a dar origem a um sistema jurídico próprio - um verdadeiro “Direito Internacional da Sustentabilidade” que não pode ser deixado de lado.
Essa ideia foi reforçada por recente decisão inédita de um tribunal holandês ordenando ao Estado que, até 2020, reduza as emissões de gases de efeito estufa em 25% em relação a 1990 - sentença que se apoiou na obrigação assumida pela Holanda em acordos internacionais, como os tratados constitutivos da União Europeia, de respeitar o desenvolvimento sustentável como princípio. Caso esse entendimento pelo Judiciário se consolide como tendência, práticas dos Estados contrárias à sustentabilidade poderiam ser passíveis de litígio, o que permitiria aumentar o poder coercitivo do Direito Internacional da Sustentabilidade, mesmo quando não existirem sanções pelo descumprimento das diretrizes a ele relacionadas.
O tratado do clima a ser celebrado em Paris acrescentará mais um importante tijolo a esse edifício, e a ausência de penalidades - que, provavelmente, será uma de suas fragilidades - não significa que este será desprovido de valor. Não só porque a legitimidade do processo da ONU faz com que as metas estabelecidas, ainda que não venham a ser obrigatórias, criem uma espécie de dever moral, gerando cobranças e aumentando a fiscalização por seu cumprimento, mas também porque os objetivos assumidos podem começar a ser vistos como um dever legal.
Além disso, acordos internacionais têm o efeito indireto de fornecer uma sinalização capaz de influenciar o comportamento de outros atores, sendo, por isso, peças fundamentais da engrenagem da governança global da sustentabilidade. Não podemos apostar apenas na ação dos Estados. É preciso envolver todas as instâncias - organizações internacionais, governos, instituições religiosas, empresas, ONGs etc. - e acionar todos os mecanismos disponíveis - tributação, certificações, incentivos à inovação, entre outros - o quanto antes.
A multiplicação das iniciativas e incentivos para a promoção da sustentabilidade, por meio de todos os instrumentos possíveis, é a nossa melhor chance de reverter o quadro atual. Com mais e mais iniciativas e incentivos, mais atores se sentirão estimulados e pressionados a mudar suas práticas. Estes, por sua vez, tendem a estimular e pressionar aqueles que ainda não aderiram a essa tendência, retroalimentando esse processo, ampliando o alcance e acelerando o movimento do círculo virtuoso da sustentabilidade.
O sucesso desse movimento depende da ascensão de uma nova consciência que leve a mudanças profundas em nossa forma de agir. A sustentabilidade precisa passar a ser vista como uma tendência inexorável e como um imperativo incontornável. Uma grande convergência nesse sentido parece estar nascendo. Tomara que se consolide em tempo de evitar maiores danos.
Fonte: http://planetasustentavel.abril.com.br
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